domingo, 6 de setembro de 2015

Mácula da Sanidade - Parte 2



Poças de Sangue



Aquém da incredulidade dos membros da força policial, o inspetor estava decidido a implementar buscas no local correspondente aonde deduzia que o corpo de Sophie Noble deveria ter caído. A procura tanto no entorno quanto no interior da reforma do antigo galpão abandonado não tiveram sucesso a principio, o local exalava um odor fétido que não ajudava e deixava óbvio o motivo da reconstrução não ter tido o sucesso desejado pelas lideranças políticas da região.

A tempos atrás, havia ali sido um armazém reservado ao e estoque de diversos frutos do mar. Ainda existiam vestígios de seu antigo funcionamento, como equipamentos de manutenção e salas de auto refrigeração, todos inutilizados pela exposição contínua ao ao ar abafado, úmidade e falta de manutenção. A tendência era que de que o cheiro de peixe e maresia, maculava toda a área, estivesse vindo exatamente do local onde a presença deles era contínua, porém o odor parecia não ter origem exata partindo de todos os lugares possíveis. Das paredes, dos umbrais das portas, do teto e principalmente do chão. Uma lufada de vento transformava o mais agradável dos perfumes em nefastas expirações pantanosas e que contribuíam intensamente para a degradação do ar que todos ali respiravam.

Estava eu sentado na calçada em frente o galpão, relaxava fumando um Pall Mall enquanto o Inspetor Marchan ainda questionava algumas pessoas que poderiam ter visto alguma coisa, sempre com alguém que pudesse anotar informações relevantes ao seu lado. Eu tentava compreender o que se passava na cabeça daquele homem, eu não costumava questionar seu raciocínio pois normalmente nós concordávamos com uma mesma lógica, mas nesse caso não me parecia que aquele prédio poderia ter alguma ligação com o suposto crime. E aqueles cálculos matemáticos, seu raciocínio levando em conta velocidade e tração, peso presumível da vítima. Era a primeira vez que o via trabalhar nessa linha de visão, principalmente sem sequer utilizar instrumentos métricos e provido apenas de sua limitada capacidade de dedução.

Voltei meus olhos em direção a janela do quarto dos Noble e mentalmente tracei uma linha reta em direção ao galpão, notei que realmente o trajeto passava por cima da casa onde foram encontrados os estilhaços da janela de ébano. Pela minha mente se passou a lembrança recente de que quando chegamos no galpão todas as janelas e portas pareciam estar fechadas, provavelmente devido ao mal cheiro. Foi quando percebi uma única janela aberta em um dos andares superiores onde deveria se localizar os antigos escritórios, por um momento pensei ter visto um reflexo vindo de lá como que uma sombra projetada por fraca iluminação de vela, até que após uma piscadela e olhar mais atento parecia não ter sido nada, porém minha curiosidade já estava aflorada e questionei um dos guardas se alguém teria ido até lá e nenhum deles souberam me responder, ao que parece todos permaneceram no andar térreo e não ampliaram as buscas devido a dificuldade de respirar no interior do galpão.

Decidido a entrar novamente, firmei um lenço no rosto para proteger minha respiração e com uma lanterna invadi a escuridão a procura das escadas. Passei novamente ao lado de uma sala de refrigeração após seguir por um longo corredor sem portas. Em silêncio um jovem oficial chamado Thompson me seguia protegendo o nariz dos odores fétidos com sua boina, ao final do corredor uma escada de madeira surgiu fazendo o caminho contrário por onde havíamos passado. O ranger das tábuas sob nossos pés alertavam por cautela, não havia certeza de que o material iria suportar por muito mais tempo ainda por um dos degraus já estar danificado, parece que a incabada reforma não havia chego nem mesmo naquele ponto do trajeto.

Após subir mais um lance de escadas me deparei com um corredor longo com fiações elétricas expostas, que provavelmente eram obras de ladrões de cobre, portas debruçadas ao chão e mobílias corroídas pelo tempo. A presença de ratos era maior naquele andar do que no térreo e o mal cheiro parecia acompanhar os malditos roedores. Haviam poças de água acumuladas em pontos específicos abaixo de onde o teto apresentava avarias estruturais. 

Havia ali também uma bolsa de couro entreaberta que não combinava com a ornamentação cadavérica daquele ambiente, dentro dela haviam equipamentos variados como um pé de cabra, alicates e uma planta de estrutura que após uma breve observação deduzi ser do próprio prédio onde nos encontrávamos, entre outras coisas. O oficial que me acompanhava percebeu algo que até então eu não havia notado, ao lado da bolsa haviam fios de cobre enrolados que estavam escondidos em baixo de lascas que haviam se soltado do teto e logo mais a frente no corredor percebemos um pequeno brilho solitário em meio a uma poça de água. Ao nos aproximar descobrimos que ali estava um revolver, o oficial Thompson tomou-o em suas mãos com cuidado e verificou uma bala na agulha e apenas duas no tambor.

O mais intrigante vinha depois que corri a lanterna para o lado da poça onde encontrei certas marcas no chão que pareciam listras de sangue, cinco listras que seguiam um caminho específico até o meio do corredor onde a única porta além dali era a que se encontrava ao final do mesmo, através do qual chegaria a mesma sala onde deveria ser o escritório que havia atraído a minha atenção.

Foi então que descobri a luz no fim do túnel. Ao final do corredor, na porta pareciam surgir três pequenos e imóveis vaga lumes. Suas luzes eram fracas e opacas e pareciam piscar em sintonia com a corrente de ar que vinha de sua direção, a fraca iluminação das lanternas me fizeram divagar naqueles três pontos luminosos até ser trago a realidade de forma espantosa pelas palavras sussurradas pelo Inspetor Marchan, que surgira como um gatuno através das trevas que povoavam nossa retaguarda.


“Três marcas de tiro na porta, provavelmente saíram da mesma arma que vocês encontraram nessa poça de água.”


Foi quando percebi que minhas suspeitas poderiam estar certas e realmente aqueles três pontos luminosos eram reflexos da tal luz de vela que, a principio, imaginava haver do outro lado da porta.

Seguindo pelo corredor, acompanhado do oficial Thompson, saquei a arma do coldre e nos aproximamos da porta. A partir daquele ponto chegava ao fim o acumulo de poças de água no chão e começavam a surgir extensas poças de sangue.

Confira a história toda na sessão Contos & Mythos

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